CRIAÇÃO DA AMBEV - EU ESTAVA LÁ!
- CLAUDETE BARROSO GOMES

- 11 de jun.
- 3 min de leitura
Em 1998 eu trabalhava como advogada sênior da Companhia Antárctica Paulista IBBC. Era responsável por contratos e contencioso estratégico, meu posto ficava na Av. Presidente Wilson, na Moóca.
Naquela época tudo me deslumbrava com tanta história, trabalhar para uma empresa fundada em 1888, onde havia até um museu. Ver documentos assinados por Rui Barbosa (sim, por ele), trabalhar sob o comando do Professor Celso Neves, gigante jurista e acadêmico, que me disse certo dia em que irrompi por sua sala ofegante após uma audiência difícil; eu falava sem parar, despejando toda minha revolta com a postura do advogado da parte ex-adversa. Ele simplesmente ouviu, com toda a paciência e experiência de seus mais de oitenta anos, cruzou os dedos longos sobre seu peito e disse quando eu parei de arfar: - Nunca perca sua fleuma!
Confesso que fui buscar no Aurélio o significado de “fleuma”. Trago esse conselho para a minha vida, o que muito me ajudou algum tempo depois no processo de fusão ou, melhor dizendo, “união” entre a Antárctica e a Brahma.
Para que entendam melhor, até 1999, Antárctica e Brahma eram as maiores empresas de bebidas no Brasil, uma paulista, outra carioca (tipo Palmeiras x Flamengo) e, por isso mesmo, concorrentes ferrenhas. O marketing externo era muito agressivo (e o endomarketing muito mais). Então vocês podem imaginar o grande choque cultural que causou o anúncio dessa união dentro de ambas empresas.
Eu fiquei encarregada de ser a ponte interna (ou interface, pra quem gosta de termos em Inglês), entre os grandes escritórios da época, Mattos Filho, Clifford Chance de NY, e entre outros. Era tudo muito grande, tudo muito importante e eu ali, tendo que fazer a triagem das informações e documentos que poderiam ser liberados para o, até então, “inimigo”. Naquela época já estávamos informatizados, mas nada comparado ao que temos hoje. Toda e documentação societária ainda constava em enormes livros pretos que cheiravam a álcool do mimeógrafo. Cheguei a dormir na empresa cuidando dos documentos societários que não poderiam deixar nossa sede. Parecia até um filme de suspense...sim eu era um pouco exagerada.
Aprendi muito nesse período. Daí surgiu meu interesse em M&A, meu título de LL.M - Master of Laws em Direito Societário pelo IBMEC, e na sequência especialização em Tributário; colhi muito frutos desse período.
Participar do nascimento de uma gigante como a AMBEV, que na época foi a primeira multinacional brasileira, me trouxe uma bagagem que vai muito além do Direito, o processo me fez ter uma visão realmente holística de toda uma engrenagem empresarial. Não digo que tenha sido fácil...não foi! A superação de paradigmas, forjado por anos de uma doutrinação empresarial de competição acirrada, foi um processo que exigiu muita resiliência, palavra até então desconhecida pela maioria.
Hoje tenho muito orgulho de ter trabalhado na Cia. Antárctica. Também tenho muito orgulho de ter feito parte da equipe de transição da AMBEV, em um esforço conjunto que abriu meus horizontes. Tudo foi muito interessante e proveitoso. Alguns olham para trás com olhos tristes, acostumados a uma realidade que hoje não mais existe. Eu prefiro olhar com respeito para a história das duas empresas, e orgulho do trabalho que realizamos, sabendo que a AMBEV não existiria senão pela união de duas potências para criação de algo muito maior.
Como cantou Cazuza, “O TEMPO NÃO PÁRA!”





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